26 de janeiro de 2009

A idiota.

“Nossas juras de amor

Já desbotadas.

Nossos beijos de outrora

Foram guardados.

Nosso mais belo plano

Desperdiçado.

Nossa graça e vontade

Derretem na chuva.

Se lembrar dos tempos

Dos nossos momentos

Lembre da nossa música.

Se voltar desejos

Ou se eles foram mesmo

Lembre da nossa música.

Um costume de nós

Fica agarrado.

As lembranças, os cheiros

Dilacerados

Nossa bela história

Está no passado

O amor que me tinhas, era pouco e se acabou.”

E eu que pensei que não existiam músicas que falavam por nós.
Ela voltava pensativa do interior da cidade onde morava. Pensativa, não. Voltava envergonhada dos pensamentos que estava tendo por causa de uma música que não saía do seu MP4.
Na ida ao interior, a única coisa que passava pela sua cabeça era de chegar lá e pegar o que tinha que pegar E PRONTO. Nada de pensar no que estava lá atrás. Na raiva da noite e do dia todo.
Foi pensando nas músicas do É o Tcham! e nas coreografias que em outra encarnação rebolou com gosto e hoje seria apedrejada se alguém a visse dançando. E o pior de tudo é que lembrava com perfeição de cada paradinha, reboladinha e mais inhas que passavam pela sua memória. E com isso, ela foi esquecendo o que tinha aborrecido o seu lindo humor de sábado.
Na volta, como sabemos, temos a impressão de que chegamos mais rápido ao nosso destino. E ela queria mesmo voltar, se possível, de jato pra casa. Com uma crise alérgica de fazer inveja a qualquer ser com rinite, ela volta com aquele fungado horroroso no ônibus.
Depois de alguns cutucões que a moça da poltrona ao lado conseguiu esbanjar em sua coxa, ela lembra do seu lindo MP4 azul que estava escondidinho na bolsa.
Aperta aqui, encaixa dali e o som começa a sair. Ela ri de algumas músicas que nem havia lembrado que tinha gravado. Começa a cantarolar quando a moça da poltrona ao lado acorda (finalmente) e liga o mp3 de seu celular.
Com essa ela não contava. Notou que estava arrumando uma platéia exigente, então decidiu cantar mais baixo. Não queria ser expulsa do ônibus que tanto lhe fazia mal e mais ainda, bagunçava seus cabelos imoralmente cacheados.
Depois de ter ouvido uma linhagem de Vitor e Leo, Los Hermanos (que eu sempre aconselho para ser ouvido), Engenheiros (que eu já disse que era pra ela parar de ouvir) e mais um pouco de Fagner pra variar. Então, ridiculamente dá de cara com uma música que nem lembrava da existência. Uma que a Vanessa da Mata deveria ter feito pensando, até hoje, que só a mãe dela iria ouvir. Aquela louca!
Ela nunca tinha fechado os olhos tão apertados daquele jeito. E nem era por causa da alergia. Era por causa da emoção da letra, do gritinho, da lágrima que estava caindo. As lágrimas costumam arder quando não são bem vindas.
Lembrou de quando uma amiga, uma vez bem ali no passado, havia falado que ela estava sentimental demais, fraca demais, chorosa demais. Que ela era o seu PORTO SEGURO e agora não passava de uma tartaruga chorona.
E dai que ela estivesse sendo uma tartaruga?
E se ela quisesse ser uma águia? Não seria a chorona predadora do mesmo jeito?
Todo mundo se depara com uma música que esquece. Que deixa guardada lá fundinho da lembrança, ou mesmo que nem tenha dado muita confiança à letra. Você, simplesmente, um dia, para pra ouvir. Desliga os sensores dos barulhos de fora, fecha os olhos, esquece a alergia e ouve. E ouve. E ouve novamente.
Tem vontade de cantar alto. Faz barulhinhos com a boca. Abre o olho na parte mais forte. Como se fosse uma sílaba tônica de uma palavra qualquer. Aquele susto, sabe? Um tapa forte.
E ela começa a se perder. Saudade. Lembrança. Raiva. Orgulho. Sorrisos. Mais lembranças. Olha pro lado, pra o outro e vê somente uma menininha que a fitava tentando imaginar por que ela estava daquele jeito. Nem decadente, nem visivelmente abalada. Somente se embalando, se abraçando, se consolando.
Ela está fazendo o que ninguém pôde fazer por ela: está tentanto se acalmar, tentando entender.
“Músicas malditas”, ela pensa.
Que nada! Ela dá meio sorriso pra menininha e volta a fechar os olhos. Repete e repete a mesma música diversas vezes. Fica imaginando que seria legal cantá-la pra aquele cara. Mostrar que ela sente tudo aquilo, que ela pensa exatamente igual. Que aquela música fala por ela. Como dizem os poetas: “nada melhor que uma canção para se falar de amor”.
Então ela tem a brilhante idéia de que QUANDO chegar em casa mandará um superemail pra mostrar essa letra. Vai atrás do vídeo no youtube. Vai colocar umas coisas bem explicadinhas. Vai dizer que ele é um idiota por não querer estar com ela, e vai lembrá-lo de como as coisas poderiam ser diferentes. Já que ela é uma mulher fantástica.
Chega em casa. Coloca a mala em um canto. Toma um banho demorado pra animar mais ainda. Pensa em todas as palavras que vai colocar. Imagina que está sendo ridícula, mas ignora tal papel. Nenhuma atriz seria tão verdadeira. Iria se vestir de heroína mais uma vez e ia fazer o que estava pensando.
Ela era A cara.
Chega em frente ao computador e...
Faz essa merda de texto que vocês estão lendo.
Nada mais, nada menos.
Idiota!



Naiane Feitoza.

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