27 de abril de 2011

Esse turbilhão de tudo isso.


A saudade é arrumar o quarto do filho que já morreu”.
(Chico Buarque)

Saudade era o seu fraco.
Sentir saudade era pior que ser traída, por exemplo.
Ela, se fosse traída, remeteria os sentimentos pra outro lugar, apertaria um “foda-se” glorioso e fim de papo. Há certas dores que o tempo mata tão rapidamente, que é inevitável o esquecimento.
Saudade, não. Saudade acumula. Asfixia. Dói. Saudade toma conta de você como um câncer. Não tem cura. É aquele mal que, quando você vê, invade até os cheiros que você guardou num cantinho de uma caixa embaixo da cama, só pra não ter vontade de sentir de novo. Aquele cantinho que você se prometeu não chegar perto. O cantinho que você brincou de esquecer.

Saudade é parecida com arrependimento. Somam-se de uma forma absurda. Unem-se. Devoram você por igual.
Você se arrepende de algo e aquilo vai te comendo por dentro. Aquela desgraça. Aquela coisa horrível. E o pior (dizem), é se arrepender do que não se fez. Mas não era o caso dela. Ela se arrependia de coisas que fez sem saber. Se arrependeu de sentir.
Ela se arrependia amargamente de sentir saudades.
Ela lutou pra não deixar transparecer certos interesses que estavam dominando seu pensamento. Ela se arrependeu de abrir a boca, também.

Ela não queria saber de paixões. E ela sabia que não era paixão. Aquilo era outra coisa. Era a vontade de ter uma. A vontade de ter aquela paixão. Aquela ali que não era sua, mas de alguém que se aproximara mais rápido que suas gripes anuais. Era, exatamente e exclusivamente, isso que a machucava tanto. Essa perda de controle. Essa batida de carro. Esse acidente de percurso. Esse medo do desastre. Essa saudade.

Entenda como quiser, mas que era uma perdição, aaaah! Isso era.
Ele a veria no seu pior estado. Naquele grau de afastamento e de vergonha. Ela queria sumir, mas não queria que ele a deixasse sumir.
Sentada. Calada. Sentida. Medrosa. Cansada. Tentou e não tentou. Frio na barriga. Zangada. Perdida. Com saudade. Com vontade. Com arrependimentos. Com vontade de ligar. Com vontade de ser ligada. Com vontade de correr o risco. Com a certeza que não dá mais e nunca deu. Ela sabe que não dá. Ele também sabe.
Ela bloqueia, ele aceita.
Ela cancela, ele obedece.
Ela desliga, ele tira do gancho.
Ela se revolta, ele sorri.
Ela se vai, ele deixa.
Ela se arrepende, ele não.

Ela quer que ele vá pro inferno, e ele não vai. Ele fica aqui e não ali. Lá, no esquecimento. Ele corrói, lembra? Corrói na saudade. Feito saudade. É saudade.
Ele permanece aqui até a vontade passar, o arrependimento sair, a saudade cansar, a curiosidade amenizar, o telefone não funcionar, o tempo passar, a cidade mudar, a presença chegar e a indiferença acontecer.
Desiste. Se consola. Se policia. Se esconde. Se prende mais ainda. Se assusta. Se surpreende. Tem medo. Corre de medo. Começa a rir e convida as pessoas a entrarem na sua vida... De novo. Só que agora, mais de perto, com menos sustos, não tão rápido, não tão estranho, não assustadoramente delicioso e só com vontades secretas. Só. Sem contar. Sem confissões. Sem garantias. Sem compromissos.
E, claro... sem sonhos. Desistiu dos sonhos.
Afinal, ela não vai saltar de lugar nenhum. Não vai arrumar quarto algum. Mas não vai deixar nada bagunçado.

Naiane Feitoza.


*Pra você que se identificou com o texto, pegue essa merda de telefone e ligue logo. LIGUE! Se não, leia novamente o texto até se convencer que esse é o certo a fazer. Mil vezes.

4 comentários:

Monique disse...

O seu melhor lado: ESSE. Adorei.

Marcelo Guido disse...

Tou sem crédito pra Tim....
puta merda

Brinalacerda disse...

AMEEEI o texto! Lindo Lindo! Um dos melhoreees!!!

Bruna da Mata disse...

Vim por estar com saudade de ler e me vem uma revolta desta no fim HAHAHAHAHAHAAHAHAHA tinha que ter sua assinatura né -.-

ps: se EU me toquei, se o indivíduo ao ler não pegou o telefone... Ele realmente nem merece que se sinta qualquer sentimento, inclusive nossa palavra mais NOSSA e bela do dicionário: SAUDADE. Um beijo, nariz!