5 de março de 2009

Doida de pedra


Minhas amigas reclamam quando seus namorados as perseguem. Lamentam o barraco do ciúme, a insistência dos telefonemas para falarem praticamente nada, a falta de noção dos horários.
Sempre as mesmas tramas de tolhimento da liberdade, que todas concordam e soltam gargalhadas buscando um refúgio para respirar.
Eu me faço de surda.

Fico com vontade de pedir emprestada a chave da prisão para passar o domingo. Acho o controle comovente. Invejável.

Não sou favorável à indiferença, à independência, ao relacionamento aberto. Fui criada para fazer um puxadinho, agregar família. Explodir em verdades, porra. Independência demais já é viagem, não me serve. Nunca servirá.
Aspiro à procura permanente do outro. Sou uma exagerada na paixão. Uma tirana. Uma ditadora. Não me dê poder que escravizo. Não me dê espaço que cultivo. Não me eleja democraticamente que mudo a constituição e emendo os mandatos. Faço tudo do meu jeito.

Quero um homem perdigueiro, possessivo, que me ligue a cada quinze minutos para contar de uma idéia ou de uma nova invenção para salvar as finanças. Quero um homem que ame minhas amigas e odeie qualquer amigo que se aproxime. Que arda de ciúme imaginário para prevenir o que nem aconteceu. Que seja escandaloso na briga e me amaldiçoe se abandoná-lo. Que faça trabalhos em terreiro para me assustar e me banhe de noite com o sal grosso de sua nudez. Que feche meu corpo quando sair de casa, que descosture meu corpo quando voltar. Que brigue pelo meu excesso de compromissos, que me fale barbaridades como pressão e ternuras delicadíssimas ao despertar. Que peça desculpa depois do desespero e me beije.

O homem que ninguém quer, eu quero. Contraditório, incoerente, descabido. Que me envergonhe para respeitá-lo. Que me reconheça para nos fortalecer.
O homem que não sabe amar recuando e não tolera que eu ame atrasado. Que parcele em dez vezes seu dia, que não pague a conversa à vista na hora do jantar, que não junte suas notícias para contar de noite como um relatório. Admiro os bocados, as porções, as ninharias. Alegria pequena e preciosa de respirar rente ao seu nariz e definir com que roupa ele vai trabalhar. E o sorriso? Aquele sorriso é a recompensa.

O amor é uma comissão de inquérito, é abrir as contas, é grampear o telefone, é perguntar, cheirar camisas, olhar 10 vezes o orkut. É também o perdão, não conseguir dormir sem fazer as pazes. É fazer amor com raiva e sorrir depois de tudo com um alívio imenso. É olhar para o lado e ver que tudo aquilo vale para o resto da vida.
O amor é cobrança, dor-de-cotovelo, não aceitar uma vida pela metade, não confundi-la com segurança. É exigir mais vontade quando ele se ofereceu inteiro. Enlouquecê-lo para tomar o remédio antes que piore daquela gripe. É entender menos e precisar mais.
Quem aspira ao conforto que se conserve solteiro. Eu me entrego para dependência. Não há nada mais agradável do que misturar os defeitos com as virtudes e perder as contas na partilha.
Não há nada mais valioso do que trabalhar integralmente para uma história. Não raciocinar outra coisa senão manter um contato. Avisá-lo para espiar a lua cheia, recordar de agosto quando começa a chover, ele decorar uma música para surpreendê-la, sublinhar uma frase para guardá-la. Lembrá-la.
Sou doida, mas doida varrida. Bem limpinha.
Quero um homem imaturo, que possa adoecer e se recuperar do meu lado. Um homem que me provoque quando não estou afim. Que me irrite com a pior piada. Que dance pra mim para se reconciliar com o passado. Que me acalme quando estou no fim do último risquinho de paciência. Que me emagreça de sorrisos.
Não me interessa um tempo comigo quando posso dividir a minha eternidade com alguém. Quero um homem que esqueça o nome de seu pai e de sua mãe para nascer em meus olhos. Em todo momento. A toda hora. Incansavelmente. E que eu esteja apaixonada para nunca desmerecê-lo, que esteja apaixonada para não diminuí-lo às amigas.



*O texto original é de Fabrício Carpinejar. Tem um tempinho que o li e achei que caiu como uma luva justamente com o que andei pensando nos últimos tempos. Coincidência ou não, me inspirei nele para dizer o que eu e mais umas dúzias de mulheres querem. QUEREM MESMO, VIU? E nem adianta fazer pose de "Sou independente" que esse papo nem cola mais.

Sou assim. E vc, é assim?

;)

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