17 de novembro de 2009

Das palavras de um amado amigo.

Esse texto que vocês irão ler agora é de um graaaaande e amado amigo meu. Ele me enviou em forma de depoimento HOJE a tarde, mas antes, se deu ao trabalho de me ligar e ler todinho pra mim.
Eu chorei de.. de.. alegria, de um sentimento que jorrou aqui dentro.
Sabe, é MUITO bom ouvir isso de um homem. E principalmente quando é mais velho que você, mais sábio, mais interessante, que foi seu professor e hoje é um grande e amado amigo.
Nos vemos todos os finais de semana. Sempre ligo: "E ai, querido retirante, vamos sair em bando? A gang ta acionada". E ele, como sempre: "Mas é claro, meu amor. Onde e a que horas?" E eu: "no mesmo lugar, na hora que você quiser e leve o Negão (seu fiel violão)"
Ai, ai.. noites maravilhosas e risos mais que espontâneos.

Obrigada, Silvio.
Não poderia só deixar num orkut pra algumas pessoas olharem e se assustarem com 12 DEPOIMENTOS. (HAHAHAHAHAHHA)... Aqui é mais bonito.

Imagem: Foto do dia do meu TCC, em 2007. Ele nos permitiu um 9.5 com cara de 10.
Meu grande mestre.

;)




Era uma vez um retirante nordestino que queria retribuir uma declaração de amor e amizade a uma menina, uma mulher, que sabia brincar com as palavras até transformá-las em sentimentos.
Em sua angústia pra dizer a essa mulher o que ele sentia por ela, caiu exausto num sono pesado já em alta madrugada, após encher o chão de sua humilde casa de papéis borrados com letras tortas e manchados de sangue, suor e lágrimas, tamanho fora seu esforço…
Há muito tempo ele – que um dia foi poeta e cantou o amor – não escrevia sequer mais uma linha sobre essas coisas de sentimento. Pensava que essas coisas talvez não existissem mais na vastidão de seu coração deserto.
Em seu sono viajou ao mundo dos sonhos e saiu, do Barroco ao Pós-Modernismo numa jornada solitária para procurar um poeta que lhe ajudasse a ter uma inspiração. Que lhe fizesse escrever um texto à altura daquela “meiga senhorita”…
Gregório de Matos, o “Boca do Inferno”, foi o primeiro que lhe recebeu. Mas foi logo lhe advertindo:
_Eu sou aquele, que os passados anos Cantei na minha lira maldizente Torpezas do Brasil, vícios e enganos…
E completou: “Se o que sentes por esta dama/ É apenas vício de cama/ Escreva-lhe um poema que lhe aumente a chama!”
Mas não era isso que o pobre retirante desejava – apesar daquela mulher ter a mais perfeita formosura que ele já tivesse visto na vida…
Seguindo seu caminho, encontrou Tomás Antônio Gonzaga que lhe mostrou um poema que havia escrito há muito tempo para sua doce Marília:
_ Eu tenho um coração maior que o mundo!
Tu, formosa Marília, bem o sabes: Um coração…, e basta, Onde tu mesma cabes…
_ É, seu Tomás _ disse o retirante: _ a minha “meiga senhorita” é como sua formosa Marília. Cabe todinha no meu coração. Mas, talvez por isso mesmo, está tão difícil encontrar palavras para expressar o que eu sinto por ela… Vou procurar os poetas românticos pra ver se eles podem me ensinar a falar de amor. Quem sabe Castro Alves me ajude…
E, assim, o retirante seguiu seu caminho após agradecer ao mestre do Arcadismo.
Alguns passos adiante e encontra o maior poeta da Terceira Geração do Romantismo. Castro Alves!
Ele se aproxima do mestre meio acanhado. Mas ao percebê-lo, o bom baiano lhe chama e lhe pergunta: “Que queres comigo?
_ Quero aprender a falar de amor. _ Disse o retirante.
Ao que o poeta lhe responde: “Amei de várias formas. Às vezes fui irreverente e disse que ‘amar era melhor que ser Deus’. Outras vezes o amor me tirou do mundo real e eu declarei: ‘Mulher! Mulher! Aqui tudo é volúpia’. Às vezes fui mais discreto e disse ‘Tua boca era um pássaro escarlate’. Noutras vezes, me fiz prisioneiro de imagens eróticas e declarei que ela era um ‘Mar de amor onde vagam meus desejos’… Mas, afinal, o que sentes?
E o retirante, boquiaberto respondeu:
_ Mestre, assim como tu amastes de várias formas várias mulheres, amo esta mesma mulher (que é só uma) de diversas maneiras. Porém, não com volúpia ou meros desejos. O que eu sinto é admiração, amizade, sei lá… estou em busca de respostas… Mesmo assim, muito obrigado!


Seguindo viagem, cruzou com Machado de Assis, José de Alencar e Aluízio de Azevedo. Mas pensou que estes senhores distintos não pudessem lhe ajudar, pois eram muito objetivos, universalistas, materialistas até. Só pensavam no presente.
Passando longe dessa turma de pensadores pragmáticos, o retirante nordestino chegou a um tal “Monte Parnaso” e lá encontrou Olavo Bilac, tresloucado, conversando com as estrelas. E com aquele olhar distante, fitou o retirante e falou como se falasse para o horizonte:
_ “Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso!” Eu, vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, pálido de espanto…
E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender as estrelas.”
_ Danou-se, seu Olavo! – Disse o retirante com seu sotaque arrastado – Essa poesia é “arretada”! Eu amo minha “meiga senhorita”. Talvez seja por isso que ela tenha me dito em seu depoimento que “A gente aprende sem brigar. Se elogia, se empolga, canta e encanta”! É que nos entendemos pelo olhar, sem precisar falar palavra alguma. A gente simplesmente se entende… Obrigado, seu Olavo! Mesmo o senhor sendo meio “doidim” de falar com as estrelas, me ajudou bastante, “visse”?!
Saindo no “Monte Parnaso”, passou por uma turma “da pesada” que só podia ter fumado alguma “coisa estragada”, pois tudo que falavam eram metáforas simbolistas.
Léguas adiante (já cansado de tanto sol), o retirante pára e pede água a um senhor meio pálido e triste que escrevia à sombra de um pé de tamarindo. Ele mal pode acreditar que estava diante de seu conterrâneo das bandas da Paraíba, Augusto dos Anjos!
_ Bom dia, seu Augusto! – disse o retirante sorrindo e estirando a mão para cumprimentar o poeta.
Mas o poeta, em seu tom sombrio, estendeu-lhe a mão com uma tesoura e lhe disse com a frieza de um cadáver:
_ Tome, Dr., esta tesoura, e… corte Minha singularíssima pessoa.
Ao que o retirante, espantado recuou e disse:
_ Cruz-credo, seu Augusto! Vá pra lá com essa tesoura que eu não sou o seu Dr., não senhor! Eu sou apenas um retirante nordestino que, como o senhor, vem das bandas da Paraíba e, depois de ter ido até o extremo norte desse país, agora vago por aí, procurando uma forma de declarar o amor que eu sinto pela minha “meiga senhorita”…
_ O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja. – falou o poeta interrompendo o retirante.
_ Não, meu poeta! Não é assim não! Tudo bem que o senhor teve uma vida medonha, mas, por favor, respeite minha “meiga senhorita”! Pois seu beijo é mais doce que o doce de tamarindo que essa árvore dá. E se ela me escarrasse, era bem feito pra eu deixar de ser enxerido. Mas ela não faz isso! Quando ela quer escarrar em alguém, ela mexe letras, forma palavras e arregaça o verbo! E suas mãos, poeta, quando afagam, parece até a carícia da brisa marinha que corre lá pras bandas das dunas de Natal! E se ela me apedrejasse, eu nem ligaria. Pois amar essa mulher vale a pena de todo jeito. E eu amo minha “meiga senhorita” inteiramente de graça, sem lhe pedir nenhum tantinho de amor em troca! A gente se ama, meu poeta! A gente se ama e se respeita muito! Tenha um bom dia!
Após mais algumas léguas de caminhada sem fim, e ainda meio triste pelas palavras de Augusto dos Anjos, o retirante escuta um som de música alta e pessoas sorrindo, cantando e bebendo. Eram os modernistas, bem “moderninhos”, por sinal! Lá estavam Mário e Oswald de Andrade e o mestre Manuel Bandeira. Porém a música era tão alta e a festa estava tão animada que o retirante resolveu pedir apenas um copo d’água para seguir sua jornada adiante.
Mas quando já estava saindo, uma mão no ombro lhe fez parar. Voltando-se para o dono daquela mão, reconheceu o mestre Drummond, que lhe perguntou: “O que queres por essas bandas, meu filho? Posso ajudar?”.
_ Procuro uma forma de expressar o amor que eu sinto por minha “meiga senhorita”. O que o senhor tem a me dizer? – perguntou o retirante.
_ A poesia é incomunicável. Fique torto no seu canto. Não ame. _ disse o poeta em tom de Segredo.
_ Desculpe, mas não entendo, poeta! Como não amar uma mulher que corresponde o meu amor do jeito que ela sabe corresponder? Como não amar uma mulher que me deixa “leso, leso” quando diz que eu sou um “projeto de perfeição”?! Com todo respeito, poeta: Sou fresco não, rapaz! Porque, se há mágica nas minhas palavras, como ela diz, nas dela tem feitiço e mel de rapadura. Se há sinceridade no meu sorriso pra ela, no dela tem o encanto dos anjos. Se há um brilho em cima da minha cabeça, na dela tem uma coroa de rainha, dona de todo o reino do meu coração. E se há milagre em meus sentimentos, nos dela há a própria vida. E é essa vida que me salva! Adeus, poeta. Mas vou continuar amando essa mulher nem que ela não queira! – disse o retirante enquanto tomava seu rumo novamente.
Um pouco irritado por não conseguir achar respostas, o pobre retirante caminhava e não conseguia tirar de sua cabeça os olhos da sua “meiga senhorita”, o sorriso às vezes sincero, às vezes debochado, mas sempre verdadeiro. E não lhe saía da cabeça sua leveza de eterna bailarina…
E enquanto vagava em meio aos seus pensamentos, topou com uma senhora simpática que lhe disse, assim, sem mais nem menos:
_ A vida só é possível Reinventada.
Era Cecília Meireles! E ele achou aquilo muito bonito e respondeu:
_ Certamente, minha senhora! “A vida só é possível reinventada”! E é isso que acontece toda vez que encontro minha “meiga senhorita”. Minha vida se reinventa cada vez que a contemplo ao meu lado. Toda vez que sinto seu cheiro e o calor do seu abraço amigo. _ E, suspirando, completou: “Ah! Aquele abraço!…”
Nesse instante, viu um senhor boa praça, todo vestido de branco se aproximando, com um copo de uísque na mão… Era o Poetinha!
_ Meu amigo, ouvi de longe o seu suspiro e vejo que está apaixonado por uma mulher!
_ Me permita uma pequena correção, seu Vinícius… Eu não ESTOU apaixonado. Eu SOU apaixonado por minha “meiga senhorita”! E como é bom amar essa mulher, meu poetinha! Como é bom ter essa mulher por perto, espantando a tristeza dos meus dias em breves momentos inebriantes…
_ Pois, então, que seja eterno enquanto dure este amor!
_ Mais uma pequena correção, meu caro poetinha! Esse é amor que dura para sempre! Pois não é só aquele amor de desejo, entre um homem e uma mulher. É um amor que transcende as fronteiras do desejo e do pecado e se torna sagrado de tão verdadeiro e puro que é! Agora, se me permite, preciso ir embora. Já se faz tarde e ainda procuro minha resposta: O que dizer pra minha “meiga senhorita”?…
Dizendo isto, o retirante acordou de súbito. Foi até a folha de papel que passara a noite toda em branco, tomou o lápis e escreveu convicto a única coisa que poderia escrever:
“Minha meiga senhorita, EU TE AMO!”

Com amor, para Naiane (minha meiga senhorita),
De Sílvio Carneiro Neto (o retirante nordestino).

(FIM)

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